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Análise do Mercado
GRANDE CONSUMO: SEIS PISTAS PARA AJUDAR A DECIFRAR 2021
Se o ano transacto foi atípico e desafiante, 2021 não promete ser menos. O contexto económico antecipa-se muito negativo e os sinais de uma crise económica não param de se avolumar.
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Se o ano transacto foi atípico e desafiante, 2021 não promete ser menos. O contexto económico antecipa-se muito negativo e os sinais de uma crise económica não param de se avolumar. E mesmo o sector do grande consumo, aparentemente menos penalizado num primeiro momento, irá sofrer um forte impacto.

Há, ainda assim, novas tendências que irão marcar este novo período e mesmo em tempos de incerteza, assimetria e volatilidade, deixo meia dúzia de pistas que poderão ajudar a decifrar 2021 no mundo dos produtos de grande consumo.

(1)   Alteração das rotinas de compra

O confinamento, o trabalho à distância e a transferência do consumo de fora para dentro de casa, associados à vontade de fazer uma compra alargada e com o menor risco possível, vieram alterar as rotinas dos consumidores, verificando-se uma diluição da compra ao longo da semana (em detrimento da anterior compra predominante ao fim de semana) e a concentração da mesma numa única loja (o chamado one-stop-shopping). Porém, a aceleração das dificuldades económicas e a recuperação progressiva da mobilidade, podem – mais à frente – fazer reverter parte destas ‘novas’ rotinas, com a redução das cestas e multiplicação das visitas às lojas.

(2)   Aumento da sensibilidade aos preços

Naturalmente, as dificuldades económicas aumentarão a sensibilidade aos preços e a procura de preços mais baixos e tenderão a impactar a estratégia comercial dos retalhistas e das marcas. Apesar disso, parece curto apresentar o preço como argumento concorrencial único ou mesmo principal. Em sentido inverso, haverá a considerar o forte agravamento dos custos de aquisição e de transporte de muitas matérias-primas nos mercados internacionais, que – mais cedo ou mais tarde – chegarão aos preços a pagar pelo consumidor.

(3)   Redesenho do fenómeno promocional

Quando se fala em dificuldades económicas acrescidas, não parece descabido adivinhar que a aposta de retalhistas e marcas possa passar por mais promoções ou, pelo menos, por promoções mais profundas. Contudo, face à vulgarização e massificação das promoções no nosso país, muito dificilmente se conseguirá um efeiro de alavancagem de venda equivalente ao de 2012-2014. O ano em curso parece, pois, mais propício ao desenvolvimento de modelos do chamado ‘every day low price’ em contraposição ao alargamento da dinâmica promocional e tal poderá verificar-se não apenas nas insígnias de discount.

(4)   Mais espaço para as marcas próprias?

É simples o raciocínio de que com a crise económica surgirá uma redução do rendimento disponível de muitas famílias e a diminuição do respectivo poder de compra e que daqui resultará, como se disse atrás, uma maior sensibilidade do consumidor em relação aos preços, oferecendo oportunidades adicionais aos produtos com preço mais baixo, o que, por associação, levará à conclusão de as marcas próprias dos distribuidores tenderão a ver crescer a sua presença e a sua quota global de vendas. No entanto, há duas outras derivadas que deverão  igualmente potenciar essa tendência: a aparente transferência de uma franja de consumidores de insígnias ‘convencionais’ para as de discout onde o peso da marca própria é incomparavelmente maior e a maior atenção, investimento e comunicação que todos os retalhistas estão a fazer em relação às suas próprias marcas.

(5)   Redefinição de sortidos

Se parece certo que o chamado consumo consciente e consumo patriótico ganharão tracção, a descomplexização da operação (ou seja, a redução do sortido) de algumas importantes insígnias e o reforço da presença das marcas próprias nas prateleiras do retalho tenderão a impactar no redesenho do sortido oferecido pelos distribuidores aos seus consumidores. Redução do sortido e aumento do peso da marca própria são, como é fácil de adivinhar, más notícias para as marcas de fabricantes e, dentro destas, muito em especial para as segundas e terceiras marcas quer perderão espaço e relevância no mercado.

(6)   Dinamização do canal online

Relevo ainda para a dinamização do canal online. O rápido crescimento ocorrido em 2020 - apesar de continuar a representar uma parte marginal do mercado (menos de 4% das vendas totais do grande consumo) – significa um conjunto de novas oportunidades, com compradores mais frequentes, novos compradores, cestas com muito mais categorias de produtos e até o desbravamento de novos territórios a nível etário ou geográfico. Mas a evolução não se está a verificar apenas do lado da procura. Também do lado da oferta surgem novos players e, por certo, alguns dos players mais relevantes (que não têm ainda uma venda online alargada) não deixarão de querer ocupar uma parcela deste canal. Mais procura, respondida por mais oferta, terá como desfecho uma dinamização acelerada do canal online no grande consumo.

Parece, pois, que num ano em que o entorno e o contexto apresentam sinais predominantemente negativos, os operadores do sector do grande consumo – fabricantes, marcas e retalhistas – terão desafios duros e difíceis, mas desafios essenciais para conseguirem sobreviver e ultrapassar mais uma crise económica que o nosso país irá inexoravelmente atravessar.

Originalmente publicado no site da Meios e Publicidade, em 2021.03.22