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Uma nova legislatura: expectativas e prioridades para uma governação eficaz
Com os resultados eleitorais apurados, o primeiro-ministro indigitado e a nova equipa governativa empossada, encerrou-se, a 7 de junho, a primeira fase de um novo ciclo político iniciado com a queda do anterior governo...
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Com os resultados eleitorais apurados, o primeiro-ministro indigitado e a nova equipa governativa empossada, encerrou-se, a 7 de junho, a primeira fase de um novo ciclo político iniciado com a queda do anterior governo, na sequência da reprovação de uma Moção de Confiança a 11 de março. Apesar da continuidade do primeiro-ministro e da manutenção de grande parte da anterior equipa, o cenário político sofreu mudanças relevantes, reflectidas em ajustes na arquitectura do Executivo e, presumivelmente, no seu programa, a apresentar em breve.

Destacam-se, desde logo, a criação do Ministério da Reforma do Estado, liderado por Gonçalo Saraiva Matias, com foco na modernização administrativa, digitalização e simplificação. Um sinal político claro de que o combate à burocracia e a reorganização do Estado são prioridades assumidas. O reforço político do Ministério da Administração Interna, agora liderado por Maria Lúcia Amaral, aponta igualmente para um reconhecimento das crescentes exigências de segurança e gestão migratória, cuja importância não pode ser subestimada num país envelhecido e com défices crónicos de mão-de-obra.

Já a junção das pastas no Ministério da Coesão Territorial e da Economia, atribuída a Manuel Castro Almeida, foi positivamente recebida pelos agentes económicos. Esta convergência entre definição de políticas e gestão de fundos europeus pode, se bem conduzida, permitir maior coerência, eficácia e agilidade na implementação de medidas estruturantes, particularmente relevantes num contexto que exige competitividade, produtividade e resiliência empresarial.

A manutenção de José Manuel Fernandes no Ministério da Agricultura e Mar, com resultados reconhecidamente positivos, e a entrada de Salvador Malheiro para a Secretaria de Estado das Pescas e do Mar, completam um núcleo governativo com relevância direta sobre áreas-chave para o universo do grande consumo.

Contudo, para além da composição orgânica, o essencial reside na estratégia de governação. No atual contexto económico, a discussão sobre o papel do Estado deve ultrapassar a tradicional dicotomia “Mais ou Menos Estado”, centrando-se antes na construção de um Melhor Estado, mais eficiente, mais focado nas suas funções de soberania e mais capaz de responder às necessidades da sociedade e das empresas. Um Estado que saiba gerir recursos com critério, evitando a lógica de constante injecção de meios financeiros adicionais como resposta a problemas estruturais. A reforma da administração pública, a reorganização funcional e a qualificação dos seus quadros são, por isso, condições sine qua non para um progresso sustentável.

Este esforço tem, porém, de ser acompanhado por responsabilidade orçamental. Qualquer reforma fiscal séria exige uma redução estrutural da despesa pública, nomeadamente da despesa primária. Não é realista reduzir impostos sem um esforço sério de contenção e racionalização do gasto, nem se pode manter uma visão excessivamente centralista da administração pública. A descentralização,  com efeitos multiplicadores e impacto direto na coesão territorial, deve substituir a tentação associada à regionalização que muitas vezes apenas reproduz ineficiências. A missão do novo Ministério da Reforma do Estado é, assim, hercúlea. Mas deve ser pautada por uma visão de longo prazo e não refém da tentação do imediatismo.

O mesmo se aplica ao Ministério da Administração Interna: gerir eficazmente a imigração e reforçar a autoridade e os meios das forças de segurança são imperativos que exigem equilíbrio entre firmeza e humanidade. A segurança não pode ser refém da retórica nem da desinformação e o controlo dos  movimentos migratórios exige um meio-caminho entre a resposta às necessidades de uma economia carente de mão-de-obra e o civismo e humanidade para com aqueles que escolhem Portugal para destino de vida e de trabalho e o controlo dos excessos, da presença de organizações criminosas que se aproveitam dos fenómenos migratórios, bem como uma resposta firme para que os vêm no nosso País campo aberto para os seus esquemas e o seu parasitismo.

No que respeita à atividade económica, há expectativas claras sobre a nova orgânica. O facto de o Ministério da Economia acumular a responsabilidade da gestão dos instrumentos financeiros reforça a coerência das políticas públicas e pode contribuir para um modelo económico mais integrado. A criação de uma Secretaria de Estado do Turismo, Comércio e Serviços, liderada por Pedro Machado, é igualmente positiva, dado o peso destes sectores na economia nacional e o seu papel na valorização da marca Portugal.

É essencial que este novo ciclo promova, de forma decidida, a competitividade, a inovação e a valorização das marcas nacionais. Para isso, a regulação dos mercados deve ser robusta, as entidades fiscalizadoras – como a ASAE – precisam de mais meios, os custos de contexto devem ser revistos e os factores de produção tornados mais competitivos. A política económica não pode assentar apenas em boas taxas de execução de fundos europeus: deve produzir impacto real, estrutural e duradouro.

Neste contexto, a Centromarca identifica como prioritária a harmonização do IVA aplicado aos produtos alimentares e bebidas, uma medida que está a ser trabalhada em conjunto com a FIPA e a APED, e que exige a articulação entre os Ministérios das Finanças, Economia e Agricultura, dado o impacto transversal que poderá ter em termos de competitividade, consumo e formalização económica.

Igualmente relevante é o dossier europeu relativo à Diretiva das Práticas Comerciais Desleais, com alterações em curso em matéria de aplicação transfronteiriça e com revisão alargada prevista ainda para 2025. Esta matéria exige uma posição negocial assertiva por parte do Ministério da Agricultura, mas também uma cooperação estreita com o Ministério da Economia, responsável pela legislação nacional e pelo enforcement. O combate eficaz a práticas abusivas depende, em grande medida, da coerência entre o quadro regulatório europeu e a realidade jurídica e económica portuguesa.

Adicionalmente, importa acompanhar com atenção a nova Estratégia para o Mercado Único, o debate sobre as European Retail Alliances e sobre as denominadas Restrições Territoriais de Fornecimento (TSCs), bem como a proposta de Regulamento sobre Atrasos de Pagamento. Estes são temas estruturantes para o bom funcionamento das cadeias de abastecimento e exigem uma abordagem baseada em factos, impactos concretos e diálogo com os agentes económicos.

Neste âmbito, a revalorização da PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar) é fundamental. Este fórum deve evoluir para cobrir toda a cadeia de abastecimento, tornando-se um verdadeiro espaço de concertação entre produção, distribuição e administração.

Por fim, o processo de revisão do Código da Propriedade Intelectual, tutelado pelo Ministério da Justiça, deve assumir uma nova centralidade. A protecção da inovação, o combate à contrafação e, em particular, a necessidade de enfrentar o fenómeno crescente das cópias parasitárias, exigem uma abordagem jurídica inovadora, capaz de proteger as marcas e os investimentos das empresas.

Em síntese, Portugal precisa de estabilidade governativa e de visão estratégica. Que este novo ciclo político, agora iniciado, possa finalmente concretizar uma legislatura completa, com resultados positivos para os cidadãos, para a economia e para as empresas que, todos os dias, constroem valor no mercado nacional e internacional.