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Opinião
SERÁ QUE PODEMOS SER OPTIMISTAS?
Tudo isto são sinais promissores, mas ainda não totalmente consolidados. Sinais que permitem mostrar optimismo, ainda que de forma não demasiado efusiva.
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Aproxima-se o final deste desafiante 2024 e começa a ser tempo de reflectir no que aí vem e naquelas poderão ser algumas pistas e projecções para o próximo ano.

O contexto geopolítico apresenta nuvens carregadas no horizonte e os cenários macroeconómicos deixam sinais fortes de preocupação, especialmente pelas indicações de ‘gripagem’ de economias – quer na Europa, quer no plano global – que foram durante décadas os verdadeiros motores de crescimento económico e social.

Contudo, quando olhamos para o consumo e se nos focarmos, em especial, no mercado nacional do chamado grande consumo, parecem existir pistas que apontam para alguma recuperação e optimismo. Para o consumidor, para os retalhistas e, obviamente, para o sector produtivo e para os detentores de marcas.

Globalmente, mas também em Portugal, os consumidores foram muito pressionados desde a primavera de 2022 e durante, aproximadamente, dois anos, mas o clima foi progressivamente mudando nos últimos meses, com os consumidores a recuperarem alguma confiança e poder de compra.

Entidades que acompanham o mercado, como a Kantar, a NielsenIQ ou a Euromonitor International, apresentaram já as suas primeiras pistas para os próximos períodos e, numa perspectiva mais global, referem, por exemplo, que a transição do consumo cauteloso para um consumo mais intencional exige uma compreensão aprofundada do que mudou, das perturbações que permanecem e do que as empresas precisam de antecipar para os próximos meses.

Alguns factores de pressão estão, nesta altura, algo atenuados, mas outros continuam bem presentes na cabeça e na carteira de muitos consumidores, mantendo-se um forte rigor sobre a forma como as potenciais poupanças podem ser utilizadas e ‘investidas’.

Genericamente, qualidade, funcionalidade, conveniência, promoção e preço são e continuarão a ser os principais factores que influenciam as decisões de compra das famílias, ainda muito influenciadas pelas dificuldades financeiras e quebra do poder de compra introduzidos pelo forte ciclo inflacionista que atravessamos. A estes juntam-se outras preocupações, como a saúde, o bem-estar, o ambiente ou a sustentabilidade, claramente também no topo das prioridades.

No entanto, nesta área – como em muitas outras – há uma forte correlação entre a dinâmica do consumo e a evolução do rendimento disponível de cada consumidor. O universo FMCG apresenta ainda algo que podemos considerar como ‘especificidade’: dada a maturidade e regularidade do consumo, o impacto das quebras de poder de compra tende a sentir-se um pouco mais tarde neste conjunto de produtos, da mesma forma que, quando se sentem os sinais de recuperação, a retoma do respectivo consumo tende a ocorrer um pouco mais tarde.

Assim, desde o início do corrente ano, sabia-se que a inflação tenderia a estabilizar e que o ritmo de crescimento dos salários reais deveria ser mais elevado que o crescimento dos preços. Percebeu-se, um pouco mais à frente, que as novas regras do IRS e os complementos extraordinários de pensões beneficiariam muitos consumidores. Sabia-se ainda que as taxas de juro (com forte impacto no rendimento disponível de muitas famílias) tenderiam a baixar, apenas não se sabia quando.

Por isto, esperava-se para 2024 uma recuperação da dinâmica no grande consumo, especialmente uma recuperação que permitisse às famílias voltar a aumentar o volume e qualidade do seu cabaz de compras.

Mas, na verdade, foi preciso esperar pelo final do 3.º trimestre para se sentir que se tinha chegado ao chamado ‘tipping point’, o momento de viragem que – aparentemente – nos permite transmitir uma mensagem mais optimista.

Nos últimos meses, vemos alguma recuperação dos volumes comprados, depois de mais de dois anos de redução constante. Vemos algum trading up, com a opção por produtos de maior qualidade e valor. Vemos que a permanente atenção aos preços e promoções, começa a ser complementada com uma maior exigência ao nível de diversidade, sortido, inovação e experiência de compra. Vemos ainda uma inflexão na evolução da distribuição das compras entre marcas próprias e marcas de fabricante, estancando o fosso que, progressivamente, se  abriu nos últimos anos.

Tudo isto são sinais promissores, mas ainda não totalmente consolidados. Sinais que permitem mostrar optimismo, ainda que de forma não demasiado efusiva. Sinais que, a concretizarem-se, podem dar um novo ânimo a consumidores, marcas, fabricantes e a uma larga maioria dos retalhistas.

É a sua qualidade de vida, sustentabilidade, rentabilidade e dinâmica que saem beneficiadas de uma conjuntura que, pelo menos no que se refere ao consumo privado e ao universo FMCG, parece ter ultrapassado o período sombrio que vivemos nos dois últimos anos.

Que a realidade possa concretizar estas previsões.

Texto originalmente publicado no Jornal de Negócios, em 2024/12/03