Em 2004, os nossos colegas do British Brands Group lançaram um documento que acabou por ter um forte impacto. Escrito por Clamor Gieske, chamava-se “The economic importance of brands – seven reasons why brands really matter”. A ideia era simples mas poderosa: mostrar que as marcas não são apenas logótipos coloridos ou truques de marketing, mas activos económicos de primeira importância. Activos que protegem os consumidores, estimulam a concorrência, alimentam a inovação e dão coesão às economias modernas.
Treze anos mais tarde, em 2017, o texto foi actualizado para um mundo já dominado pelas plataformas digitais e pela avalanche de dados. Agora, em 2025, a terceira versão surge num cenário ainda mais desafiante: a revolução da Inteligência Artificial, que está a transformar a forma como compramos, escolhemos, confiamos e até como nos relacionamos com o que é “real” e “autêntico”.
O trabalho de Gieske não perdeu actualidade. Pelo contrário, ganhou urgência. As suas sete razões continuam válidas: as marcas mantêm-se totalmente focadas na protecção do consumidor, no reforço do desempenho empresarial, na garantia de mercados concorrenciais, na ajuda à adaptação da economia, continuam a atravessar fronteiras, a beneficiar todos os envolvidos e a responsabilizar as empresas. Mas, mais do que as repetir, importa olhar para o que estas ideias significam hoje, num tempo em que os algoritmos decidem cada vez mais por nós.
È fácil constatar que vivemos uma época em que qualquer produto pode ser replicado, em que uma máquina gera imagens indistinguíveis da realidade e em que as recomendações personalizadas são feitas por sistemas que pouco percebemos. Nesse mar de abundância e opacidade, qual é a âncora a que nos podemos agarrar? A resposta é simples: a confiança.
É aqui que as marcas voltam a ter um papel essencial. Não tanto como um sinal de estatuto ou diferenciação superficial, mas como garantia de autenticidade. Quando tudo pode ser fabricado por uma IA, a confiança torna-se o último luxo, e as marcas que a conquistam e preservam são as que sobreviverão.
Gieske propõe uma ideia particularmente forte: a de que as marcas estão a evoluir de sinais identificativos no mercado para uma espécie de infraestrutura invisível. Isto significa que, mais do que ajudar a escolher entre o detergente A ou B ou a cerveja C ou D, elas tornam-se filtros indispensáveis para manter vivas a diversidade cultural, a liberdade de escolha e a responsabilidade das empresas.
Num mundo onde algoritmos podem simplificar demasiado as opções ou até manipulá-las, as marcas funcionam como guardiãs de valores humanos. Ajudam-nos a distinguir não só o que comprar, mas também em quem confiar e que princípios e valores queremos reforçar através das nossas escolhas.
Este não é apenas um debate teórico. Para as empresas, a lição é clara: investir em marcas não é um capricho de marketing, é uma estratégia de sobrevivência. Num mercado saturado de informação e de inteligência artificial, são as marcas fortes que seguram a relação com o consumidor, que atraem talento, que dão estabilidade financeira e que alimentam a inovação.
Para os decisores públicos, há também uma mensagem importante: proteger e valorizar as marcas é proteger a própria qualidade e robustez da economia. Mercados sem marcas fortes tornam-se mais opacos, mais vulneráveis a práticas desleais e menos inovadores e em Portugal temos um bom exemplo disso mesmo.
Mais de vinte anos depois do primeiro ensaio, o que impressiona é como esta reflexão continua a ganhar peso. O novo relatório do British Brands Group termina com uma ideia que devia fazer parte da agenda de qualquer líder: as marcas são a infraestrutura que mantém a humanização dos mercados. São o sistema operativo invisível que nos permite continuar a escolher de forma consciente, que nos oferece diversidade cultural e que obriga as empresas a responder por aquilo que prometem.
Numa era em que a tecnologia ameaça tornar tudo indistinto, as marcas podem ser a bússola que garante que não perdemos de vista o essencial: confiança, autenticidade e liberdade de escolha.
PS: a referência a este importante relatório do British Brands Group tem ainda uma razão adicional… daqui a poucas semanas a respectiva liderança mudará de mãos, com a reforma de John Noble e a entrada em funções de Tom Reynolds. Para além das boas-vindas ao Tom, uma palavra muito especial para o John Noble: um verdadeiro amigo e mentor, que acompanhou a Centromarca praticamente desde a sua fundação, alguém a que me habituei a ver como um verdadeiro ‘guardião’ do mundo das marcas e a quem queria deixar aqui o meu sentido Muito Obrigado.