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Opinião
A COMPETITIVIDADE NÃO TEM GEOGRAFIA, MAS PRECISA DE UM MAPA
A geografia da competitividade desenha-se com as nossas escolhas. Ou seremos capazes de transformar a regulação, a fiscalidade e a estratégia europeia em alavancas de crescimento, ou ficaremos reféns da nossa própria periferia.
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A Centromarca reuniu empresários, decisores e especialistas para debater a ‘Geografia da Competitividade’. O tema pode parecer abstrato, mas a sua realidade é concreta e diária para os setores do grande consumo e agroalimentar. Estes são setores vitais, que moldam a vida das pessoas, no concreto do dia e a dia, e projetam a imagem de Portugal, mas que vivem hoje sob uma enorme pressão: regulatória, fiscal, competitiva e de mutação dos padrões de consumo.

A questão que nos guiou foi clara: conseguiremos transformar esta pressão em energia competitiva? A resposta é um “sim” condicionado. Sim, se tivermos a coragem de tomar as decisões estratégicas que se impõem. Da intensa discussão, destaco quatro conclusões que traçam o mapa para um Portugal mais competitivo.

1. Precisamos de uma regulação-impulso, não de uma regulação-obstáculo. Não comungamos com a ideia de uma desregulação do mercado. A regulação é essencial para que o mercado funcione de forma eficiente e justa para todos. Contudo, o que temos hoje, em muitas matérias, é uma tempestade legislativa, vinda de Bruxelas e de Lisboa, que cria obrigações desajustadas e desproporcionais. Não precisamos de mais regras, precisamos de regras mais focadas e de um enforcement eficaz. A regulação deve ser um garante de confiança e um impulso à inovação, não um travão à capacidade de as empresas competirem numa economia global.

2. As empresas são os vértices da competitividade, mas não operam milagres sozinhas. O nosso tecido empresarial, das PMEs às grandes multinacionais, é o verdadeiro motor que transforma inovação em vantagem e escala em eficiência. No entanto, enfrenta obstáculos sistémicos – da dimensão ao financiamento, passando pela complexidade regulatória. A colaboração entre empresas e o fortalecimento das cadeias de valor são cruciais, mas é imperativo que o ecossistema em que operam seja favorável. As empresas estão a fazer o seu trabalho, adaptando-se às exigências da sustentabilidade e da digitalização. Falta saber se, enquanto país, estamos a fazer o nosso.

3. Portugal pode (e deve) passar da periferia à centralidade. A nossa condição geográfica não pode continuar a ser um fado. Num mundo em reconfiguração, com novas cadeias de valor globais e a importância crescente do Atlântico, Portugal tem uma oportunidade única para se afirmar como uma plataforma de centralidade na estratégia europeia. Os setores do grande consumo e agroalimentar são embaixadores privilegiados para levar a marca Portugal mais longe, mas para isso é preciso que a competitividade seja pensada à escala europeia, aproveitando o Mercado Único e os instrumentos financeiros ao nosso dispor para consolidar a nossa posição.

4. A fiscalidade não é um detalhe técnico. É o teste decisivo à nossa ambição competitiva. De todos os temas, um emergiu como o obstáculo mais crítico e transversal: a fiscalidade. O atual sistema de IVA na alimentação e bebidas é um labirinto complexo, fragmentado e arbitrário, que gera distorções de concorrência, penaliza a inovação e limita as escolhas do consumidor.

Não é sustentável que, num ciclo inflacionista como o que vivemos, a fiscalidade tenha funcionado como um amplificador do problema, em vez de um amortecedor. A harmonização do IVA alimentar, que a Centromarca, a APED e a FIPA, sob a égide da CIP, estão a propor através de um estudo aprofundado, não é um pedido de baixa de impostos. É uma exigência de coerência, transparência e equidade. É um investimento estruturante na competitividade do país.

Em suma, a geografia da competitividade desenha-se com as nossas escolhas. Ou seremos capazes de transformar a regulação, a fiscalidade e a estratégia europeia em alavancas de crescimento, ou ficaremos reféns da nossa própria periferia. O debate está feito. O tempo de adiar as decisões terminou.

O texto foi originalmente publicado no Jornal Económico, em 2025.10.29