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Opinião
EUSUMIDOR, UM CONSUMIDOR CONTINUAMENTE EM MUDANÇA
O pós-pandemia e a crise global que estamos a atravessar, estão a alterar forma como vivemos, como consumimos, como compramos ....
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O pós-pandemia e a crise global que estamos a atravessar, estão a alterar forma como vivemos, como consumimos, como compramos e os dados que vão sendo sucessivamente conhecidos mostram que, hoje, somos menos sociáveis, que passamos bastante mais tempo em casa e que estamos cada vez mais desconfiados em relação ao futuro.

A apresentação, há dias, dos resultados do estudo Trends Review 2021-2022 elaborada pela The Cocktail, uma empresa do grupo WPP, mostra que o consumidor mudou… e está continuamente a mudar.

A análise considerou a evolução do consumidor num conjunto de áreas específicas: da vida profissional, evolução do consumo, vivência durante os anos de pandemia à sustentabilidade, à casa ou à socialização, passando pelo bem-estar (especialmente emocional)… e conclui que a satisfação geral com a vida dos cidadãos diminuiu significativamente em relação à satisfação do período pré-pandemia. Nada de surpreendente.

E conclui, também, que o consumidor dispensa o alarmismo, estando especialmente carente de mensagens positivas, seja das autoridades, seja dos media, seja também, claro, das marcas.

Por exemplo, a saturação de mensagens negativas, conjuntamente com o desconforto gerado pela pandemia, faz com que, pela primeira vez, a percentagem daqueles que se mostram dispostos a modificar o seu estilo de vida em prol da sustentabilidade, tenha diminuído. Ou seja, parece necessário introduzir um tom positivo e subtrair dramatismo ao tom com que as marcas abordam a questão da sustentabilidade. O impacto e a responsabilidade parecem já estar assumidos e a mensagem, nesta nova fase, deverá ser de confiança, capacidade e propósito, ligando sustentabilidade e prazer, recompensando a acção e o envolvimento.

O confinamento também provocou mudanças importantes nas nossas casas. Não só pelos investimentos que têm sido feitos para permitir aí desenvolver, de forma continuada, as nossas actividades profissionais, mas também, por exemplo, para a realização de exercício físico, para a elaboração de um maior número de refeições ou mesmo para um maior tempo de lazer passado no lar.  A nossa casa passou a ser o local onde acreditamos poder recuperar o poder e o controle sobre as nossas vidas e onde somos nós que estabelecemos os limites.

E, mesmo sendo fácil perceber uma certa euforia quando se processa o regresso a uma relativa normalidade, é também verdade que uma alargada franja da população está a sair da pandemia muito menos sociável e pensa continuar a passar mais tempo em casa, um espaço onde muitos se sentem mais seguros e tranquilos. Um espaço configurado de acordo com os seus receios e as suas aspirações, face a um sentimento de desconforto em relação à vida no exterior.

Para além, obviamente, da consolidação do teletrabalho, seja em regime exclusivo, seja em formato híbrido, que está a gerar uma progressiva flexibilização na gestão do dia-a-dia. Trabalhar em casa, ou a partir de casa, é visto por muitos – também em função do tipo de trabalho que desenvolvem - como uma nova opção de liberdade, flexibilidade e conforto. Tanto que, entre aqueles que não podem trabalhar em casa, o teletrabalho tornou-se uma referência aspiracional. E para os que estão a entrar no mundo do trabalho, quase como um pré-requisito.

Apesar de hoje, os nossos olhos estarem quase totalmente focados na realidade disruptiva e inflacionista e de o nosso cérebro fazer um sério esforço tentando esquecer as agruras e angústias provocadas pelo Covid, a experiência da pandemia deixou uma forte marca, individual e colectiva. Uma marca bem negativa.  As pessoas sentem-se claramente menos felizes no dia-a-dia, mais angustiadas, enervadas e reactivas e com uma menor satisfação geral com a sua vida e com as rotinas do seu quotidiano.

E confiam menos no futuro… o que os leva a reflectir e questionar mais sobre a sua própria vida, a sua própria existência, querendo, de certo modo, reinventar a sua realidade.

Os consumidores – refere o estudo - acreditam que, num horizonte de dez anos, estaremos mais sozinhos, estaremos mais preocupados com as questões de saúde (incluindo a saúde mental), que haverá mais divórcios e menos nascimentos. Acreditam, também, que as suas prioridades mudarão, implicando, por exemplo, menos apego emocional ao trabalho e uma menor socialização e confiança que os fará olhar mais para si mesmo.

Isso pode significar, por exemplo, uma menor intenção de compra de produtos de moda e beleza ou que, ao contrário, os consumos ligados ao EU tenderão a crescer. Um exemplo: a compra de livros cresce 25% face ao pré-pandemia, mas o grande salto faz-se nos que abordam temas da autoajuda, onde o incremento ultrapassa os 40%.

Não é difícil compreender que o consumo tende sempre a oscilar entre uma componente social e o benefício directo a nível individual, entre o que consumir uma marca ou um produto diz sobre nós, entre a dimensão social do consumo, entre o consumo como atividade social, entre o consumo que acompanha o próprio lazer e, do outro lado, a sua vertente individual, mais emocional, mas também mais pragmática e funcional, mais orientada para o ‘trabalho’ do EU...

E as pistas apontam para um consumidor pós-pandemia mais preocupado com o EU e menos com o CON.

Mais EUsumidor e menos CONsumidor.

Mais concentrado no que lhe gerará benefício e prazer de acordo com os seus próprios critérios e, ao mesmo tempo, menos ansioso em relação à opinião social dos outros em relação aos seus gostos e preferências e mesmo em relação à sua própria imagem. Mais ambicioso no controlo dos espaços que domina.

Na verdade, conjuntamente com a CASA, o universo do CONSUMO é um dos territórios em que o EUsumidor pode efectivamente exercer esse poder, um poder que perdeu significativamente noutras ´geografias’.

Estas mudanças irão exigir às marcas e organizações uma fortíssima capacidade de reacção, um empenho sem paralelo face ao que era realizado no período pré-pandemia. 

Irão exigir-lhes um ‘toque-de-magia’ para atingir as novas expectativas de um consumidor que ainda não decidiu, ele próprio, o destino final da viagem que iniciou a partir de 2020, as novas expectativas de um consumidor continuamente em mudança.