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DEMOGRAFIA COMO DESAFIO E OPORTUNIDADE PARA AS MARCAS
Porque o tema foi repetidamente puxado para as campanhas eleitorais de muitas autarquias do país – os municípios mais ‘jovens’ ou mais ‘velhos’, municípios que nos últimos dez anos viram aumentar ou diminuir o seu número de habitantes ...
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DEMOGRAFIA COMO DESAFIO E OPORTUNIDADE PARA AS MARCAS

Porque o tema foi repetidamente puxado para as campanhas eleitorais de muitas autarquias do país – os municípios mais ‘jovens’ ou mais ‘velhos’, municípios que nos últimos dez anos viram aumentar ou diminuir o seu número de habitantes – e porque alguns analistas conceituados trouxeram o tema para a discussão pública, parece que finalmente se começa a observar com mais atenção a mutação demográfica que o país atravessa e as suas implicações aos mais diferentes níveis.

O envelhecimento populacional é cada vez mais notório e o impacto da pandemia na natalidade, veio colocá-lo ainda mais a nu. Contudo, se os impactos mais facilmente percebidos – diminuição da população activa, sustentabilidade dos sistemas de segurança social, incremento dos custos em matéria de saúde, políticas activas de apoio aos mais velhos,… - estão identificados (mas muito longe de estar resolvidos) é também verdade que há inúmeras oportunidades que a população sénior oferece e que estão ainda a larga distância de estar devidamente aproveitadas, pelo país, pela nossa economia ou pelas marcas.  

O que fui lendo nas últimas semanas fez-me recordar um texto que escrevi, salvo erro, nos inícios de 2015, em que tentava chamar a atenção para o tema. Escrevia então:

O INE apresentou, há poucos meses, as suas ‘Projecções de População Residente 2012-2060’, sendo que os respectivos dados apanharam aparentemente de surpresa os nossos meios de comunicação social e analistas de ocasião. A mutação demográfica é, sem dúvida, um tema de dimensão estrutural e multigeracional, obrigando a reflexão dos que hoje têm poder de decisão, daqueles que estão nas fases mais avançadas da vida, mas também dos mais jovens e dos que irão ainda nascer.

Deveria ser também um tema forte na discussão de estratégias que se confrontarão no próximo ciclo eleitoral, pois o recente ‘ganhar de consciência’ deriva da publicação cada vez mais qualificada sobre o tema. Aquelas Projecções permitem constatar a necessidade e o valor da informação. Quantificar o problema torna-o mais visível e perceptível. E impedem que os políticos e as políticas continuem a ignorar ou desvalorizar este dossier.

O tema [tem vindo a ser] praticamente reduzido ao impacto dos números projectados na questão da sustentabilidade do nosso sistema de segurança social e ao facto de, em três gerações – que, grosso modo, é o que nos separa de 2060 – o índice de envelhecimento aumentar de 131 para 307 idosos por cada 100 jovens. Ou de nesse mesmo período, o índice de sustentabilidade potencial passar de 340 para 149 pessoas em idade activa por cada 100 idosos. E estes valores não correspondem sequer aos cenários mais catastrofistas…

Era igualmente importante analisar as muitas outras vertentes do tema, sejam as associadas à baixa natalidade e às razões para tal, à duração das carreiras contributivas, ao início mais tardio dos percursos profissionais, ao aumento da empregabilidade feminina, ao nascimento dos primeiros filhos em idades cada vez mais avançadas, aos impactos dos fluxos migratórios ou às respectivas consequências ao nível, por exemplo, dos apoios sociais e à natalidade, do nosso modelo de ensino ou das valências das unidades hospitalares nacionais.

Ou, do ponto de vista económico, analisar as consequências para o futuro do país ao nível, por exemplo, do investimento, da inovação, da criação de emprego, da adequação de competências ou do empreendedorismo. E, não tenhamos dúvidas, um país envelhecido é um país tendencialmente insustentável, que provavelmente se transformará, a breve trecho, num país inviável…

Reverter a Inversão da Pirâmide é, porventura, o desafio mais complexo que como país enfrentamos e se o diagnóstico, de uma forma por vezes excessivamente simplista, estará feito, já em relação às pistas de solução parece-me estarmos longe, muito longe, de uma verdadeira linha de orientação.

Apoios à natalidade? Discriminação fiscal positiva a partir do primeiro filho? Estabilização económica e criação de emprego? Inversão dos fluxos migratórios? Tudo isto são mais frases feitas do que propriamente políticas públicas. De mais a mais, quando, em inúmeras situações, o Estado dá com uma mão o que tira com a outra, ou seja, promove duma forma o que inibe de outra.

Para além disso, a natalidade corresponde, em si mesma, a um acto de consciência individual e, salvo raras e muito honrosas excepções, a baixa natalidade é constatada em mais amplo grau nas classes económicas mais favorecidas o que, de algum modo, contraria aquelas linhas de orientação e coloca a questão: conseguirá a política estatal ultrapassar o egoísmo civilizacional?

Este é, efectivamente, um desafio para gerações, um desafio em que muito será exigido a quem nos sucede e em que apenas o somatório de decisões individuais inteligentes, mas solidárias, permitirá a minimização do problema.

Mas é igualmente crucial adaptar as nossas estruturas ao país que somos e ao país que seremos e perceber que sendo este um enorme problema e um sinal claro de decadência civilizacional, é também uma oportunidade para nos adequarmos aos desejos e necessidades daqueles que conformam o Portugal de Hoje. E o Portugal de Hoje [apesar de mais velho] não pode ficar parado.

Pode dizer-se que o aumento da população à escala global oferece uma oportunidade para as nossas empresas e para os nossos produtos, mas não podemos negar que esse crescimento é, cada vez mais, o resultado de uma natalidade mais controlada associada a um aumento claro da esperança (e da qualidade) de vida.

Por outro lado, a sustentabilidade só é possível, se o acréscimo da riqueza gerada pela via do que produzimos e vendemos, mais do que compensar aquilo que cada um de nós aporta individualmente nos dias de hoje, e que forçosamente diminuirá com o envelhecimento da população. Para tal, é necessário produzirmos mais, produzirmos diferente e, essencialmente, produzirmos melhor, pois de outra forma essa riqueza por certo não nos irá cair no colo

Há, por estes dias, uma atenção crescente do mercado e, em especial, do chamado sector do grande consumo, para a necessidade de adequar os seus produtos às exigências de um cada vez mais alargado grupo de consumidores. Hoje, os maiores de 50, em Portugal e para lá das nossas fronteiras, não são, como muitas vezes se ouve, um nicho de mercado. Hoje, os maiores de 50 são já o mais relevante segmento de mercado, um segmento potente, crescente e apetecível.

E são um segmento da população com necessidades específicas não apenas no que se refere às características intrínsecas do próprio produto, mas também, por exemplo, na forma como realiza os seus actos de compra ou ao nível da mobilidade ou das acessibilidades. Se em muitos produtos, há que fazer uma (maior ou menor) adequação das suas características, embalagem ou forma de apresentação para ir de encontro às necessidades destes consumidores, noutros há que repensar completamente a oferta disponível ou desenvolver, de raiz, novos produtos.

Mas este é também um território de eleição para as Marcas.

Pela sua tradição e especialização, pela inovação dos seus produtos e das suas formas de comunicação, pela proximidade com o consumidor e pela capacidade de fazer parte das suas vidas, as Marcas poderão adquirir um espaço acrescido e serem, por excelência, um modelo de geração de riqueza, num mundo em que inovação, diferenciação e comunicação são as armas mais eficazes no combate à massificação, banalização e empobrecimento.

As Marcas serão seguramente, pela adição de valor que proporcionam, uma forma de (re)conquistar o futuro, mas sem perder de vista o presente.

As Marcas podem ajudar a que consigamos sobreviver às dificuldades que actualmente atravessamos, potenciando as exportações e promovendo uma substituição eficaz das importações.

As Marcas podem contribuir para condições de vida mais dignas para as gerações mais velhas, permitindo-lhes o acesso a produtos e serviços que até há pouco tempo lhes estavam vedados e que são verdadeiros indutores de uma melhor qualidade de vida.

As Marcas podem, finalmente, ajudar a reconstruir as expectativas das gerações vindouras, oferecendo-lhes a possibilidade de desenvolver trabalho qualificado e desafiando-as a explorar o seu espírito inovador e a sua criatividade, ajudando-as a retirar algum do enorme peso que temos vindo a colocar sucessivamente sobre os seus ombros.

Apostar nas Marcas e na consolidação das Marcas Portuguesas é, pois, apostar num Portugal melhor e num Portugal com mais futuro!”

Mais de seis anos depois, não sinto que o texto esteja desactualizado ou que se tenha avançado tanto, como supunha então que avançaria. O tema é incómodo e parece haver uma preocupação dos responsáveis do país e das forças partidárias em tentar evitar uma discussão em que poucas soluções estão pensadas para contrapor aos problemas identificados. Infelizmente, essa é uma forma quase atávica de lidar no nosso país com as mais fundas dificuldades e os mais complexos desafios: ignorar, evitar a discussão e ‘varrer’ os temas para ‘debaixo-do-tapete’.   

Nos últimos anos, a seniorização do mercado é cada vez mais notória. Não apenas é visível uma expectativa de vida cada vez mais longa. A mais anos de vida, corresponde para uma parcela crescente dos mais idosos, uma ponta final de vida de melhor qualidade, em que viver suplanta claramente o sobreviver, com maior disponibilidade financeira, maior capacidade de beneficiar de múltiplas experiências e maior capacidade de consumo.

E a tudo isto, pode somar-se o facto de, em tantas famílias, os mais idosos serem a âncora financeira e de suporte familiar para as gerações mais novas, o que converte os séniores em compradores e prescritores, para si próprios, mas também para filhos e netos.

Por tudo isto, não são apenas os produtos ou os espaços comerciais que devem ser sustentadamente pensados para esta parte tão relevante da população, é também o esforço de inovação e o investimento de comunicação que, para eles, deve ser crescentemente direccionado. Porque, não tenhamos dúvida, este será, dentro de meia-dúzia de anos, o mais amplo e poderoso segmento de mercado, seja em Portugal, seja em todo o mundo ocidental. E isso implica uma actuação inclusiva, implica políticas positivas de ligação dos mais velhos ao mundo do trabalho, implica a sensibilização dos restantes grupos etários para esta revolução que está em curso.