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Economia
CORONAVÍRUS, TURISMO E SAÚDE
Apesar de, por esta altura, muitas pessoas estarem totalmente focadas na saúde, na sua saúde, na saúde dos seus e na saúde pública, em termos mais genéricos, e estarmos todos metidos nesta espécie de paralisia pandémica que faz lembrar a velha imagem
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E nessa quase inércia, está a gerar um rasto de destruição. De vidas humanas e de histórias de angústia. Mas também as marcas de um enorme bulldozer que vai arruinando a economia, as empresas, os postos de trabalho e a saúde financeira dos estados.

Começam a multiplicar-se os Estudos realizados pelas mais reputadas consultoras que vão antecipando o que serão os impactos da crise provocada pelo Covid-19 nas diferentes área da economia e tentando dar algumas pistas sobre os diferentes cenários de recuperação, sendo, contudo, que nenhuma destas análises consegue estabelecer um aspecto de base, fundamental à avaliação desses impactos e construção de cenários: quanto tempo vai ainda demorar esta crise? Sendo que - ninguém tem dúvidas - quanto mais longa esta crise for, mais profundos serão os seus efeitos e mais lenta a recuperação económica até regressarmos novamente à ‘normalidade’.

Unânime sim, parece ser a constatação que um dos sectores mais afectados será o do turismo, não apenas durante a própria crise, mas nos meses ou anos que se lhe seguirão.

Para Portugal, números de 2018 colocavam o Turismo como o mais importante sector da economia, com um peso a rondar os 14% do PIB. É verdade que estes números resultam sempre do conjunto de parcelas que se aglutina, mas qualquer que seja o ângulo, o peso na criação de riqueza, no emprego ou no maior ou menor equilíbrio da balança de pagamentos com o exterior é brutal. Há quem não o encare dessa forma, mas o turismo é., de longe, a maior fonte nacional de exportações.

Esta crise pode potenciar o crescimento do turismo nacional, a recuperação do ‘vá para fora cá dentro’, mas basta pensar no que ocorreu nos últimos anos no Porto e em Lisboa, mas também em Braga, Coimbra, Évora ou Açores e em tantos outros locais, para perceber como a dinâmica económica que Portugal mostrou, em especial a partir de 2014, foi fortemente alavancada pelo turismo.

Quando, em 2011, Portugal foi intervencionado pela troika, muitos (onde me incluo) escreveram que os efeitos daquela recessão económica demorariam uma geração a ser ultrapassados. O nosso país, mesmo com os defeitos atávicos que mantém, surpreendeu-me, surpreendeu-nos, surpreendeu o mundo, recuperando muito mais rapidamente do que mesmo as mais optimistas previsões apontavam. Aparentemente, essas são armas que temos como povo: a capacidade de nos regenerarmos e nos reinventarmos. E nessa luta, o turismo e as exportações deram um contributo essencial.

Mas há uma diferença substancial entre 2011/2014 e o momento actual. O turismo vai ter dificuldades em funcionar novamente como o Prozac da nossa economia. Os produtos portugueses vão ter dificuldades em se impor nos nossos principais mercados de exportação, também eles em profunda recessão.

Mas as marcas portuguesas e as empresas portuguesas continuarão precisar do turismo e das exportações, como de pão para a boca…

Pelo menos numa coisa esta crise acabou por gerar um resultado positivo. Fez abortar a discussão sobre a necessidade de investir milhares de milhões de euros num segundo aeroporto para servir Lisboa. Um empreendimento que iria ser um sugadouro de recursos e um foco potencial de problemas, éticos e legais. E faz recordar o que ocorreu em Sines, cujo arranque de investimento, realizado imediatamente antes do choque petrolífero de 1973, converteu aquele que era um ‘desígnio nacional’ num enorme elefante branco que ainda hoje ensombra as finanças nacionais.

Lia há dias um excelente artigo de Rui Moreira no Expresso, sobre os impactos desta crise no país e nas nossas vidas, em que referia que um fenómeno deste tipo tem alguma similaridade com o que ocorreu na sequência dos atentados do 11 de Setembro. E de como eles introduziram novos medos e uma profunda insegurança no mundo. Hoje, o ‘inimigo’ é invisível e silencioso, mas nem por isso menos feroz…

Essa comparação levou-me a um outro raciocínio, a de como Portugal, pela constatação reforçada de ser um país calmo, tranquilo, simpático, bafejado por geografia e clima, mas não prejudicado por tensões rácicas, religiosas ou políticas acabou por sair vencedor no benchmarking do turismo. Segurança, foi durante anos um argumento não proclamado, mas sempre presente.

E, não tenho dúvidas, no mundo pós Covid-19, a palavra de ordem será Saúde, que mais não é do que uma forma mais específica de dizer Segurança. Ninguém viajará, nem em trabalho e menos ainda em lazer, se o destino não for considerado Seguro e Saudável.

Saudável, porque a situação no destino, ao nível da saúde pública, estar permanentemente sob controlo. Saudável, porque o visitante tem de confiar no sistema de saúde local para o caso de ser vítima de um qualquer problema pessoal ou ser apanhado no meio de uma borrasca como a que vivemos actualmente.

É por isso que é tão importante a resposta que Portugal dê durante esta crise. É por isso que é tão importante que consigamos manter a situação controlada e dar um sinal de elevada cidadania e responsabilidade. É por isso que é tão importante continuar a investir, nesta emergência, mas também no período que se lhe seguirá, numa saúde de elevada qualidade e a nível dos melhores no plano internacional.

E dessa forma, sem falsas hipocrisias, responder positivamente durante uma crise que tão graves problemas está a gerar noutros países, como a Itália, a Espanha ou mesmo a França, países que, todos sabemos, são competidores potentes no mercado do turismo internacional e destino com atractivos semelhantes aos oferecidos por Portugal. Saibamos marcar a diferença!

Originalmente publicado no semanário Vida Económica em 2020.05.01