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Opinião
ARRISCAR NA INOVAÇÃO NUMA ECONOMIA EM TURBULÊNCIA
As marcas não só impulsionam a lealdade e a emoção e criam preferência, como também geram um prémio. As pessoas estão preparadas para pagar mais por uma marca que oferece o que elas procuram.
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Compreender as marcas é fundamental para o sucesso das nossas organizações, não apenas no presente, mas também no futuro. Para os menos ‘enfarinhados’ nestes temas, uma marca pode parecer apenas um rótulo ou um logo usado para vender um produto, mas no seio das empresas muito tempo uma parcela muito elevada do investimento é dedicado ao desenvolvimento das marcas e, através delas, na criação de condições para que sejam reforçadas as ligações emocionais com os seus púbicos e os seus consumidores, garantindo assim a respectiva fidelidade. E tenta-se fazer isso de forma persistente e consistente.

O mais importante é, sempre, que as pessoas reconheçam e se lembrem do que as marcas representam. Em boa verdade, as marcas são tão importantes para os produtos como os nomes são para as pessoas e os pais bem sabem como a escolha do nome para um filho, não é aleatória e transporta consigo uma série de valores: da tradição familiar, à força do próprio nome ou ao perfil de figuras reconhecidas que o usaram anteriormente.

As marcas (tal como os nomes) carregam não apenas bagagem emocional, mas também uma grande ligação emocional. E é isso que quem trabalha no ecossistema das marcas pretende permanentemente alcançar. Construir as marcas por forma a gerar uma conectividade emocional real e intensa, fidelizando o consumidor e criando preferências reais. Em muitas situações, o poder da marca sobrepõe-se ao puro pragmatismo da escolha. Basta pensar como escolhemos um telemóvel, um carro ou umas sapatilhas.

Portanto, as marcas não só impulsionam a lealdade e a emoção e criam preferência, como também geram um prémio. As pessoas estão preparadas para pagar mais por uma marca que oferece o que elas procuram. A razão subjacente a essa disponibilidade para pagar mais, pode ser diferente de consumidor para consumidor, mas em muitas circunstâncias ela deve-se ao relacionamento cúmplice e único que as pessoas têm com uma determinada marca individual. E seja qual for o relacionamento com aquela marca específica, o consumidor certamente acredita que ela está a garantir-lhe determinados atributos.

Isto acontece com uma alargada gama de produtos, mas quando são bens de compra menos regular e de maior valor, é ainda mais fácil perceber como, ao mudar o logo – e com ele a marca – muda também a percepção do consumidor, a sua atitude e o que ele está disposto a pagar por determinado produto, com base nas qualidades e atributos que entende que ele lhe oferece. As marcas criam uma espécie de atalho mental.

Mesmo no universo que nos é mais próximo, a perspectiva não é distinta. Quando entramos num supermercado, gastamos, em média, 20 minutos para comprar 50 produtos. Se pensarmos que num espaço de retalho alimentar de média dimensão podem existr 30 mil diferentes referências ou SKU’s. isso significa que o consumidor ‘rejeitou’ 29.950, ou, se quisermos, rejeitou (ou não escolheu) 1.500 produtos por minuto.

O que as marcas permitem é que sejam criados atalhos através da grande variedade de produtos e mensagens diferentes que competem pela nossa atenção num espaço muito restrito. Isso demonstra porque é que as marcas são tão valiosas no universo FMCG. Dependendo da empresa, as respectivas marcas podem representar entre 40% e 75% do seu valor de mercado e é por isso que elas devem ser fortemente protegidas e acarinhadas.

O que as empresas marquistas tentam, em permanência, fazer, é transformar um produto numa marca, com o objetivo de construir uma marca icónica, rentável e sustentável para o futuro e fazem-no desenvolvendo o que podemos designar como estruturas de memória distintas.

Uma parte relevante prende-se com a aparência do produto… as cores usadas, o tipo de letra, as fontes, a forma como o nome é posicionado numa embalagem, o tipo de material de embalagem utilizado e, claro, onde o produto é colocado no interior da loja. Tudo isso, aliado à publicidade usada, contribui para a criação da marca e impulsiona as conexões emocionais com o consumidor.

Depois de desenvolver a marca, é necessário pensar em como fazê-la crescer de forma sustentável. Uma das ferramentas mais poderosas é a da inovação. E porquê inovar? Desde logo, porque há que continuar a satisfazer os nossos públicos e, assim, ganhar vantagem sobre a concorrência. Mas num ambiente livre e competitivo, inevitavelmente, boas ideias serão rápida e naturalmente imitadas.

Mas também se inova para permanecer relevante. O que funcionou para os consumidores há 20 anos não funciona necessariamente hoje e, na verdade, não funcionará necessariamente no futuro. As marcas devem, por isso, garantir que continuam actualizadas com o que os seus consumidores procuram.

No entanto, a inovação é um investimento extremamente arriscado e, como tal, muito oneroso. Um estudo de meados da década passada, referia que menos de 20% de todas as inovações de produtos conseguiam gerar um crescimento significativo de vendas e apenas 14% proporcionavam valor à categoria. E, na verdade, a situação hoje é ainda mais problemática. Ou seja, mais de quatro quintos, do investimento em inovação realizado todos os anos, não produz qualquer efeito.

Por isso, fará sentido perguntar por que é que as empresas se devem preocupar com a inovação quando a taxa de sucesso é tão baixa e, especialmente, se essas mesmas empresas detiverem marcas fortes e bem-sucedidas? Mais ainda, quando os mesmos estudos referem que são exactamente as empresas com mais fortes e mais representativas aquelas sustentam os mais elevados níveis de inovação?

A resposta passa por chamar a atenção de que, num clima económico cada vez mais difícil, a inovação tende a proporcionar uma alternativa relativamente viável ao que se está a tornar uma dependência cada vez maior de profundas promoções de preços. A inovação cria valor e os consumidores estão preparadas para pagar mais pelos produtos que contenham inovação entendida como relevante… mesmo num ambiente económico mais difícil.

E, finalmente, enquanto fabricantes de marca, a inovação pode proporcionar algum isolamento competitivo. É reconhecido que as quotas de marcas próprias dos retalhistas são mais baixas nas categorias onde se percebe que há mais e melhor inovação.

A inovação, em boa verdade, constitui-se como um dilema. Sabemos que devemos inovar para nos mantermos à frente da concorrência e gerar valor e rentabilidade nos nossos negócios. Mas como o devemos fazer? Uma primeira análise indicaria que a inovação deveria ser algo novo, completamente disruptivo e absolutamente inovador. No entanto, é possível pensar na inovação enquanto evolução e não como revolução. Uma inovação que deve começar com um conhecimento profundo do seu negócio principal, da sua especialização, e evoluir a partir daí. Essa é poderá ser uma forma de fazer crescer o seu negócio de forma consistente.

Muitas das inovações surgem no mercado, pretendem substituir núcleos de produtos cujo ciclo de mercado entrou em declínio. Muitas vezes a partir da construção de submarcas, outras através de extensões de categorias e outras ainda através de extensões de gama. Não estaremos a falar exactamente de uma inovação disruptiva, mas, apesar disso, de uma inovação significativa para o mercado. Uma análise adicionai mostra a que o que estes casos de sucesso têm em comum é o facto da inovação surgir ‘em cima’ de uma base de marca forte e central.

E nunca deve ser esquecido que a inovação não funciona em circuito fechado nem é um fim em si mesma.

Há que identificar correctamente as oportunidades de mercado, o que pode parecer óbvio, mas significa entender se o novo produto é aquele que o consumidor está à procura e está disposto a comprar. Os estudos mostram que muito poucas inovações mudaram completamente os hábitos de consumo. Há que questionar se o novo produtos contribui para a consistência e credibilidade da sua marca e se terá um impacto positivo na sua percepção e valor.

Então, como obter sucesso num ambiente onde há uma taxa de insucesso tão elevada? Uma vez mais, os estudos mostram que muitos desses falhanços não têm uma relação directa com o correspondente esforço realizado a nível de investigação e desenvolvimento e que há uma probabilidade mais ampla de insucesso quando uma inovação promissora é realizada através de marcas menos fortes. Inovar em cima de uma marca em declínio ou de uma proposta de consumo reduzida é o equivalente em termos de marca a ter um filho para salvar um casamento... Muito insucessos ocorrem, não por causa do produto em si, mas porque o conceito e o posicionamento do produto foram mal pensados.

Os casos de maior sucesso, por outro lado, partiram de conceitos e posicionamentos bem desenhados. E também porque foram investidos os recursos adequados no momento do lançamento do novo produto, mas também no suporte dos momentos subsequentes. E, claro, porque o produto – comprovadamente – cumpriu a promessa da marca.

Em conclusão, a inovação bem-sucedida, gera valor, cria emprego, desenvolve know-how e fomenta a concorrência e as marcas que querem manter o seu sucesso actual e crescer no futuro, só podem ver a inovação uma energia vital e uma força propulsora.

NOTA: ao arquivar documentos mais antigos, cruzei-me com uma das Brand Lectures que os nossos colegas do British Brands Group regularmente realizam. A ‘lecture’, focada no tema da inovação – e que, em larga medida esteve na base deste texto - foi da responsabilidade de Fiona Dawson, na época, Managing Director da Mars UK e hoje Presidente do Chartered Management Institute, para além de administradora não-executiva da Lego, da Marks & Spencer e da Kerry .