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Opinião
REPOSICIONAR AS MARCAS: EM MODO SEDUÇÃO COM OS CLIENTES
As marcas continuam a acreditar que são um ativo essencial para a diferenciação de estratégias comerciais e de modelos de negócio no moderno retalho, mantendo a capacidade de atrair o consumidor
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No universo FMCG, a natureza dos produtos, a frequência de compra, o relativamente baixo valor e a conveniência do consumidor dificultam a existência, por exemplo, de lojas próprias das marcas e convidam á existência de espaços - físicos ou digitais - que concentrem a resposta a diversas necessidades, que concentrem diferentes famílias de produtos, que concentrem múltiplas marcas.

Por isso, as marcas do chamado grande consumo veem a sua relação com o consumidor intermediada por retalhistas especialistas ou generalistas e, obviamente, têm de seduzir o cliente antes mesmo de conseguir seduzir o consumidor

Hoje, num contexto particularmente adverso, as empresas fabricantes sentem um agravamento da pressão sobre a sua estrutura, a sua operação e as suas margens e indicam que têm uma reduzida folga para absorver adicionais de custos, a somar aos incorporados especialmente nos últimos doze meses, mas continuar a manter um relacionamento positivo com os seus clientes na interatuação para demonstrar a relevância das suas marcas no quadro das estratégias comerciais do retalhista e na relação com o consumidor, sendo, em simultâneo, geradoras de tráfego e rentabilidade para as insígnias da moderna distribuição.

As marcas continuam a acreditar que são um ativo essencial para a diferenciação de estratégias comerciais e de modelos de negócio no moderno retalho, mantendo a capacidade de atrair o consumidor e de funcionar como referencial hierárquico na gestão da categoria, para além de manter elevados níveis de investimento no ponto de venda, seja a nível de mecânicas promocionais, seja de animação de loja ou de experiência de compra.

As marcas consideram que, pelo menos no cenário atual, antevendo as suas mais prováveis evoluções e tendo em conta o elevado peso dos principais grupos de retalho, continuarão a ser um contribuinte fundamental para a equação de rentabilidade das mais importantes cadeias da moderna distribuição e que essa contribuição pode ser reforçada através da diferenciação e da adaptação das referências presentes em cada retalhista ao respetivo perfil de lojas e de consumidores.

As marcas referem que continua a existir uma razoável recetividade à inovação e à entrada no mercado de novos produtos, por parte do retalho, em especial das insígnias de sortido mais longo. Contudo indicam também que esse interesse nem sempre se reflete na paciência necessária a que os novos produtos tenham sucesso no mercado, que a sua comercialização se circunscreve, em muitos casos, a conjuntos limitados de lojas e que os custos de acesso continuam excessivamente elevados, colocando em causa o investimento previamente efetuado.

As marcas ainda encaram com algum cuidado a aposta e o investimento em canais de comercialização para lá do moderno retalho, do canal Horeca e do canal seletivo (para as empresas que já nele operam) e o retalho mais tradicional, conectado via canal grossista. Áreas comos as das lojas diretas, presença comercial em marketplaces, ligação a operadores nativos online ou a empresas de deliveries ainda são vistas como sorvedoras excessivas de recursos face às receitas e contactos que geram. Contudo, a conjuntura presente e, em especial, a transferência de consumo para as marcas próprias pode empurrá-las para a aceleração do investimento em canais alternativos e diferenciados de comercialização, beneficiando da digitalização crescente do consumidor e da respetiva aderência a novos modelos de compra e de entrega. 

Finalmente, parece existir um razoável consenso que a reconfiguração a que se está a assistir no retalho alimentar em Portugal e os novos paradigmas de mercado tendem a ser especialmente penalizadores para as marcas não líderes presentes em cada categoria, dada a redução do potencial de penetração e do espaço de prateleira na generalidade das insígnias.

Por tudo isto, recomenda-se:

 

[08] Em modo sedução com o retalho

O jogo da prateleira joga-se entre marcas distintas, com perfis distintos e funções distintas… mas a escolha, a nível de sortido e de preço, cabe sempre ao dono da prateleira. É ele que define a proposta de valor que oferece ao seu cliente.

Às Marcas de Fabricante cabe seduzir o retalhista para que lhe conceda espaço para os seus produtos e quanto mais amplos e melhores forem os seus argumentos, a nível de inovação e de diversidade, de diferenciação e de experiência, com conveniência e reputação, demonstrando o seu conhecimento da categoria, do consumidor e das suas necessidades, maior será a probabilidade de entrar e permanecer no linear.

No entanto, essa sedução pode ser ainda reforçada com dois trunfos de peso: as Marcas oferecem geração de tráfego e capacidade de chamar novos consumidores e geram uma rentabilidade acrescida e consistente.

 

[09] Dosear água quente na água fria

As dificuldades geradas pelo contexto económico no mercado são inequívocas, prejudicam o poder de compra dos consumidores, penalizam as suas escolhas e ajudam à aceleração e ao crescimento das marcas próprias.

A dinâmica das insígnias de sortido curto induz essa aceleração, mas a reação das insígnias ditas ‘convencionais’, aumentando significativamente a parcela das marcas próprias nas suas vendas totais acaba por dar o contributo mais significativo para o crescimento da quota global das marcas de distribuidor.

Mas será pela via do reforço e da melhor presença das Marcas de Fabricante que as insígnias ditas convencionais tenderão a recuperar a preferência do consumidor e as outras – as insígnias de sortido curto - terão a capacidade de atrair novos shoppers.

 

[10] Abrir a Caixa da Promoção

A promoção, depois do fortíssimo impacto que teve – no período da troika - nas dinâmicas de mercado e na evolução do peso relativo de marcas de distribuidor e Marcas de Fabricante, foi-se progressivamente convertendo de dinamizador de vendas em fator ‘higiénico’ para assegurar alguma manutenção de status quo em várias categorias de produto.

Para muitas marcas, as vendas em promoção chegam a representar mais de três quartos das vendas totais, colocando dificuldades em perceber como reagiria o mercado a outros cenários.

Assim, no momento atual, e sem fazer o desmame à promodependência, é difícil utilizar a promoção como fator efectivo de recuperação de vendas e como forma de desbloquear e induzir modificações nas dinâmicas do mercado

Reduzir o gap de preço e manter os níveis de comunicação no ponto de venda que a promoção atual permite, deve ser complementado com um racional fora da caixa e que mexa com a estagnação em que nos encontramos, através, por exemplo, de acções ‘para-lá-do-preço’, com cross-selling com outros produtos e marcas ou com programas de fidelização desenvolvidos pelas próprias marcas.

 

[11] A propósito de cestos e de ovos

Os últimos três anos provocaram alterações profundas na sociedade, na mobilidade, nos comportamentos individuais, no consumo e, também, no racional e na jornada de compra. Novas propostas surgiram, umas embrionárias, outras mais consistentes, tentando dar uma resposta a essas alterações e conquistar a preferência dos consumidores.

Apesar da ‘acalmia’ que se sente hoje no online do universo FMCG (que se segue a uma forte aceleração em 2020 e 2021 e a alguma travagem a partir daí), existe hoje vontade, por parte do shopper, de testar e usar mais frequentemente modelos distintos de compra, de entrega e de acesso aos produtos

Havendo, hoje, a constatação da, por vezes, excessiva dependência das vendas de muitas marcas relativamente a um número limitado de insígnias, é, pois, o momento de colocar ovos noutros cestos e investir em canais diferenciados de comercialização, físicos e digitais, e em formas alternativas de route-to-market, estabelecendo pontos de contacto alargados com o consumidor.

 

[12] Fazer do próximo mais perto

As alterações de comportamento e mobilidade por parte dos consumidores ‘empurraram’ os conceitos de proximidade, sendo que muitos são ‘compressões’ das lojas do retalho moderno.

Contudo, há redes independentes que apostam no serviço, na personalização e numa oferta pensada nos agregados que rodeiam as lojas

Há que ‘alimentar’ estas redes, pensar em acções e materiais adequados a esses espaços, conquistar lineares para marcas relevantes localmente

 

[013] Uma meia meia feita, outra meia por fazer

O regime legal que enquadra as relações comerciais no nosso mercado sofreu uma evolução muito positiva ao longo da última década, seja fruto de iniciativas nacionais, seja resultado de diplomas comunitários diretamente aplicáveis em Portugal.

Contudo, o correspondente impacto ao nível da implementação nem sempre teve uma dinâmica equivalente, com algum déficit seja em monitorização, seja em fiscalização, quer por limitação de foco, quer por escassez de meios.

Há, pois, que promover e adotar as afinações que o quadro legal ainda necessita, seja em matéria de PIRC, de Prazos de Pagamento, de Promoções ou de Cargas e Descargas, sem perder de vista pontos de há muito identificados como relevantes como os dos Débitos Históricos, da Discriminação Não Objetiva entre Marcas ou das condições de Desreferenciação, nem esquecer o fenómeno das Alianças Internacionais de Retalhistas.

Mas, acima de tudo, há que apostar em ferramentas avançadas de monitorização do mercado e de conferir meios, humanos e técnicos, mais substanciais e mais adequados às autoridades competentes, a começar pela ASAE.

 

Na próxima semana avançaremos com o último conjunto de recomendações, dessa vez as mais associadas com o relacionamento entre as marcas e os seus principais destinatários: as pessoas. Até lá...