ALMA DE MARCA
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Opinião
ESTÁ NA HORA…
Nesse documento e agora, de viva-voz, colocaremos, desde logo, o Consumidor no centro da análise
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Quando escrevo estas linhas tinha-se concluído há poucas horas o folhetim em que se converteu a eleição da segunda figura do nosso regime constitucional: o Presidente da Assembleia da República.

Os resultados das eleições de 10 de Março já o deixavam antever, mas logo ao primeiro dia ficou claro que poder legislativo e poder executivo se regerão, se não por novas regras, certamente por novos princípios e por equilíbrios que não estão ainda construídos (e que parecem difíceis de construir), fazendo prever uma elevada instabilidade e enormes dúvidas quanto à duração desta legislatura.

No entanto, esperamos – apesar de tudo – ter um governo em funções já nos próximos dias, mas que governará em permanente tensão, sabendo que todas as decisões que careçam de aprovação da Assembleia da República, representarão sempre uma batalha dura, com dúvidas permanentes em relação à respectiva aprovação.

Também nas próximas semanas, retomaremos os contactos usuais com os responsáveis das pastas governativas que mais directamente tocam nos nossos dossiers e há que conquistar atenção, conquistar simpatia para os temas, elucidar os problemas, ajudar na construção das soluções. Nada realmente novo para quem se move no meio associativo, mas com a novidade de estarmos perante novos governantes, com novas visões e prioridades.

Iremos retomar os temas do Memorando que preparamos antes do acto eleitoral, mas agora focando-o no actual contexto e nos novos personagens, seja no Executivo, seja no Parlamento, seja – inclusive – em algumas entidades da administração pública.

Nesse documento e agora, de viva-voz, colocaremos, desde logo, o Consumidor no centro da análise e apontaremos como prioridades maiores:

Reposição do Poder de Compra: face aos incrementos de custos – preços, juros, taxas e impostos – sentidos pelas famílias nos dois últimos anos e a correspondente não actualização de rendimentos (via salários e fiscalidade), é importante reforçar efectivamente o poder de compra das famílias portuguesas; é a sua qualidade de vida, regime nutricional, saúde e bem-estar que estão em causa e que se devem reaproximar de padrões próximos dos restantes cidadãos europeus,

Indução da Literação Financeira: o comportamento de compra e consumo do consumidor depende, amplamente, do maior ou menor nível de informação a que aceder e que absorver; uma melhor literacia, especialmente a nível financeiro, contribuirá para consumo mais racional, mais adequado às suas necessidades e mais sustentável. A aposta na educação, em diferentes níveis, será sempre um caminho mais adequado do que, por exemplo, o da coercção ou da fiscalidade.

Reforço da Informação de Mercado: é essencial que autoridades, organizações e empresas acompanhem, com proximidade, as alterações de comportamento e de padrão de compra dos consumidores. A adopção de medidas desfasadas no tempo das efectivas necessidades de intervenção, são pouco eficazes e geram resultados desajustados. Reforçar a qualidade da informação é fundamental às políticas públicas e à actuação dos operadores no mercado e ainda a

Defesa da Liberdade de Escolha: a liberdade de escolha é um valor essencial em democracia. Um mercado afunilado, de oferta pouco diversificada e que não permita ao consumidor o acesso a muitos produtos e marcas da sua preferência, é um mercado imperfeito e que cria limitações ao consumo e ao desenvolvimento económico. De forma proactiva, as políticas públicas devem pugnar pelo reforço da diversidade, inclusividade e sustentabilidade.

Em relação ao Mercado chamaremos especial atenção para os temas do:

Reforço da Monitorização: nunca de deve esquecer a velha asserção de que “o que não se consegue medir, não se consegue gerir”.; num mercado bastante desequilibrado e construído em cima de relações comerciais permanentes, é muito difícil (e arriscada) a apresentação de eventuais queixas formais face a dificuldades enfrentadas; assim, é fundamental que as autoridades realizem uma monitorização permanente do mercado, que para além da informação, gerará um efeito de dissuasão. 

Operacionalização do Observatório de Preços: a constituição do Observatório de Preços Agroalimentar foi um passo importante para aquele esforço de monitorização; contudo, é relevante evidenciar que uma parcela importante dos movimentos ao longo da cadeia – aqueles que se fazem entre fornecedores e retalhistas – não são devidamente avaliados e que os problemas, no universo FMCG, não se limitam à área alimentar, sendo igualmente importante acautelar o seu financiamento. 

Melhor Regulação dos Prazos de Pagamento: a legislação nacional, em matéria de prazos de pagamento no sector alimentar, saída da transposição da Directiva UTP, apresenta incoerências que urge resolver, a actual discussão, na UE, sobre o novo regulamento de combate aos atrasos nos pagamentos é uma boa oportunidade de criar regras mais eficazes de ataque a uma prática desleal que repetidamente ocorre e que, com os actuais níveis de taxas de juro, tem elevado impacto financeiro e a

Avaliação do Poder de Compra e do Poder de Mercado: não obstante os diversos acertos legislativos introduzidos na última década e que contribuíram para uma maior fluidez e equidade no mercado, continua a prevalecer um forte desequilíbrio negocial ao longo da cadeia de aprovisionamento; avaliar o impacto de eventuais situações de abuso de posição dominante, mas também do excessivo poder de compra e poder de mercado reforçará a respectiva transparência e lealdade.

A nível da Marca faremos questão de salientar a:

Defesa da Não Discriminação entre Marcas: os retalhistas possuem, na sociedade actual, uma função primordial no abastecimento das populações e reivindicam para si, como ocorreu durante a pandemia, a condições de infraestrutura essencial; no entanto, com a legitimidade própria do dono da prateleira, escolhem os produtos que pretendem disponibilizar ao consumidor, sendo que há uma inequívoca (e desleal) vantagem dada aos produtos das suas marcas próprias, face aos detidos pelos seus fornecedores.

Combate às Cópias Parasitárias: a legislação consagra, de há muito, a protecção de marcas, modelos e produtos, no quadro da propriedade intelectual; não obstante ser uma prática repetida, há um combate difícil mas efectivo desenvolvido pelas autoridades em matéria de falsificação, usurpação e de contrafacção; contudo, essa cobertura legal é praticamente inexistente relativamente aos copycats ou cópias parasitárias, sendo que é necessário avançar também nesse sentido.

Direccionamento de Apoios para as Marcas: os regimes de apoios às empresas, por razões históricas e atendíveis até dada altura, privilegiou o financiamento de investimentos físicos e materiais, em detrimento das despesas imateriais, nomeadamente ao nível de marcas e marketing; a construção de valor, induzida pela inovação, diferenciação e identificação deveria ser premiada e adequadamente apoiada, como caminho para uma verdadeira cultura de marca e ainda o

Reforço das Marcas como Indutores de Exportação: a economia portuguesa especializou-se, em demasia, numa óptima de subcontratação e de outsourcing; são muito poucas as marcas portuguesas com reconhecimento internacional e praticamente nenhumas com impacto global; é fundamental, pois, trabalhar na internacionalização das melhores marcas nacionais, beneficiando as exportações portuguesas, mas também através da construção da percepção de que existe um impactante Portugal-de-Marcas.

A nível de Regulação, reforçaremos as preocupações que, de há muito, vimos vincando:

Limitação Temporal da Emissão de Débitos: as relações comerciais no universo FMCG, desenvolvem-se diariamente e são validadas a todo o momento, sendo que os retalhistas tendem a fazer encontros sistemáticos de contas entre os pagamentos aos seus fornecedores e os débitos emitidos por supostos serviços prestados; por isso, não há justificação, nem ética nem operacional, para reclamar aos fornecedores de supostos débitos não emitidos com muitos anos de distância dos eventuais factos geradores. 

Estabelecimento de um Princípio de Pré-Aviso de Desreferenciação: a contratualização entre fornecedores e retalhistas abrange um amplo leque de produtos e um quadro temporal alargado; por vezes, os retalhistas desreferenciam produtos – deixando de os adquirir – sem qualquer indicação ou aviso prévio; o pré-aviso dessa interrupção, deveria estar legalmente previsto, pois, para além de ter implicações contratuais, pode gerar custos acrescidos, em especial  quando os produtos são especificamente fornecidos àquele cliente.

Redinamização da PARCA: a Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Alimentar (PARCA) foi absolutamente instrumental na concretização da legislação PIRC, na formalização do Código de Boas Práticas Comerciais ou na transposição da Directiva UTP; no entanto, os últimos executivos têm progressivamente desvalorizado a sua actuação, sendo importante proceder à sua redinamização e à reconstrução desse espaço de diálogo.

Participação consequente no processo de revisão da Directiva UTP: a fortíssima e mediática contestação que tem vindo a ser desenvolvida pelos agricultores e suas organizações em toda a União Europeia motivaram uma atenção bastante mais significativa do que a que se anteciparia há alguns meses, relativamente ao processo de revisão da Directiva europeia de Unfair Trading Practices (UTP); é pois, muito relevante, que Portugal tenha posições vincadas, mas consensuais, sobre o sentido da revisão a defender, não esquecendo as razões daquela contaminação, mas tendo o cuidado de as enquadrar e da construção de respostas adequadas, mas equilibradas.

Em matéria de Fiscalidade, o nosso principal contributo fixar-se-á na:

Harmonização do IVA Alimentar: a fiscalidade, em sede de IVA, que incide sobre os produtos agroalimentares, seja para alimentação humana, seja para a alimentação animal é, hoje, profundamente injusta e incoerente.; a reversão da medida IVA 0% e o acréscimo de arrecadação fiscal gerado pelo período inflacionista, criam condições para uma discussão consequente sobre uma potencial harmonização da taxa aplicável a este importante universo de produtos; uma discussão que deveria ser objecto de consenso parlamentar alargado, justificável pela

Simplificação Fiscal e Não Discriminação entre Produtos: o actual formato de construção do Código do IVA e, especialmente, dos seus anexos I e II, relativos à aplicação das taxas reduzida e intermédia, favorece a dúvida e a necessidade constante de esclarecimento por parte dos operadores económicos que colocam produtos no mercado; assim, aquela harmonização favoreceria a simplificação fiscal, auxiliaria uma mais fácil actuação das autoridades e não promoveria a discriminação entre produtos. Pelo

Reforço da Competitividade Fiscal Transfronteiriça: num país que tem uma largura máxima de 200 km, a proximidade à fronteira é muito elevada e, obviamente, favorece o comércio transfronteiriço, para além de custos operacionais distintos, potenciados pelas diferenças na dimensão e localização do mercado, a penalização em termos de fiscalidade desfavorece o retalho e os fornecedores a operar em Portugal, para além - claro - da própria arrecadação fiscal nacional e ainda pela

Não Penalização Fiscal da Inovação: a construção do Código do IVA, restringindo a aplicação das taxas reduzida e intermédia apenas aos produtos especificamente indicados nos respectivos anexos, é altamente penalizadora para o arrojo e o investimento implícitos em cada produto efectivamente inovador que é colocado no mercado e a que, por definição, será sempre aplicada a taxa máxima de imposto, gerando, desde logo, diferenciais de preço de 10 ou 17%.

Finalmente, a nível de Sustentabilidade, defenderemos a:

Regulação das Alegações Ambientais: acautelar que as definições estabelecidas na Diretiva Green Claims estejam alinhadas com as estabelecidas na proposta Empowering Consumers for the Green Transition, permitindo capacitar os consumidores para a transição ecológica, e defender a introdução de uma nova definição de “evidências científicas reconhecidas”, bem como prever que os mecanismos de verificação sejam facilmente aplicáveis.

Limitação das Barreiras à Embalagem: garantir que na transição verde e caminho para a economia circular, são assegurados os possíveis mecanismos de redução de impacto ambiental e a máxima reciclagem possível, não esquecendo que os direitos de Design e Marcas devem ser protegidos, respeitando a sua importância económica, criativa e os requisitos de saúde que representam; não deve ser esquecido que a embalagem é um factor essencial para a segurança do produtos e um elemento de facilitação e garantia para a compra.

Reforço da Acessibilidade a Produtos Sustentáveis: na Europa discute-se o acesso à informação e a dados, o acesso a matérias-primas sustentáveis, o acesso a produtos produzidos com uma cadeia de valor que assegure os direitos humanos e sociais das pessoas que nele trabalharam, o acesso a produtos sustentáveis e que garantam a economia circular… lembremo-nos que o ponto de partida é a satisfação da necessidade do consumidor e a facilitação do acesso ao produto e ainda a

Salvaguarda dos Direitos de Propriedade Intelectual: com o desenvolvimento do digital e do comércio eletrónico, é essencial reforçar a legislação e os meios de defesa da Propriedade Intelectual nas diferentes plataformas e formatos possíveis, é fundamental que sejam assegurados os mecanismos, associados à marca, que permitam o acesso do consumidor a produtos originais, genuínos, seguros, de qualidade, sustentáveis e de origem garantida.

Este é um Caderno de Encargos amplo e relevante, mas pode ser sintetizado em oito ideias e prioridades de acção.

Desde logo, a MARCA DEVE SER FACTOR ESSENCIAL DE DIFERENCIAÇÃO E VALOR, havendo que priorizar os apoios à sua criação, construção e internacionalização.

Deve também PUGNAR-SE PELA HARMONIZAÇÃO – 6% - DO IVA ALIMENTAR, porque a alimentação, humana e animal, não é definitivamente um luxo (...e, em boa verdade, a higiene também não)

Deve, igualmente, DEFENDER-SE UMA MAIOR RACIONALIZAÇÃO DOS PRAZOS DE PAGAMENTO, apostando em prazos mais curtos, numa maior circulação de capital e, consequentemente, em menores necessidades de crédito

Não esquecendo que a LEGISLAÇÃO DEVE CUMPRIR PROPÓSITO NOS PERÍODOS MAIS TENSOS E DIFÍCEIS, como aqueles que se antecipam nesta fase, exigindo-se mais proactividade das autoridades, mais meios de acção, mais poder de dissuasão.

Tendo sempre em mira que o CONSUMIDOR DEVE TER A MAIS AMPLA LIBERDADE DE ESCOLHA, defendendo-se um mais amplo sortido, uma melhor identificação de origem e modo de produção,…

E que para tal deve DEFENDER-SE CONCORRÊNCIA MAIS LEAL ENTRE MARCAS, limitando a desreferenciação e a discriminação não objectivamente justificada.

Complementarmente deve FOMENTAR-SE A PREVENÇÃO EFECTIVA CONTRA COPYCATS, densificando o conceito e o seu enquadramento legal enquanto prática desleal.

Sendo fundamental DEFENDER-SE A PROPRIEDADE INTELECTUAL A 360º, relevando que todas as revisões legislativas devem sempre considerar os direitos de PI.

Esperamos agora encontrar, no Governo e na Assembleia da República, os interlocutores certos e a necessária abertura e boa-vontade para que estes tópicos sejam, paulatinamente, compreendidos, decididos e implementados, sabendo que nos temos de munir de uma elevada dose de persistência e de paciência e de recordar a todo o tempo que, como diz o poeta, o caminho se faz caminhando.